terça-feira, 31 de janeiro de 2012

A vida de meu corpo

                                                               Ser imortal é insignificante; com exceção do homem,  todas
                                                               as criaturas o são,  pois ignoram a morte.
                                                              (Jorge Luis Borges, O imortal in O Aleph, Ed Globo/Mec, 1972)


Não há quem mais gulosa seja
Na fome de  si mesma
Senão essa coisa sem nome que é a vida
Como uma vez bem nomeou, sem nomear,
Clarice.


Da célula,  invisível ao nosso olhar,
uma única ou milhões,
Liquens, cogumelos,
gigantesco jatobá, aves, peixes, borboletas, 
ao nosso mediano corpo,
tudo que tem vida
se move mais ou menos
mas  tem fome sempre,
neste contínuo, imenso elo 
de partos de sementes, fragmentação
óvulos fecundados
mitogênese,
em que a vida alimenta a vida.

Ela deixará um dia
Aquele que eu,  hoje,  digo ser,
Pois a cada um deixa
e jamais a todos.

E me espalhará faminta
no imperceptível do seu mundo
onde nada se perde
a não ser
a singela,
a pura
a simples
a desimportante
unidade orgânica.


É  insondável
Se sobrará alguma coisa mais
deste  que conhece a morte.
Mas não será com certeza deste corpo
de matéria feito,
inteiro retornado ao todo.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Fantasia marítima

Pedro
no porto
aponta
a  proa
para  o pôr do sol.

Soerguida
ao  vento
a  ló  malogra o intento
da  partida.

Invento só
de  quem jamais deixou a terra.

Nem para o ar
Nem para o mar
são os pés  plantados
no chão duro, 
empedrado
De Pedro.

Ainda assim
num desplante
de  andarilha
a  alma  solitária segue
a trilha da última luz do dia.

Reinventou-se Pedro.