terça-feira, 10 de abril de 2012

Cantata



Solidão de catedral
Ecoam no  alto
O oboé d´amore
E a  voz de contralto
Pro Deo  honore.

Angustia inominável
Desejo ardente da alma
Sopro que não acalma
Contrição interminável

Por um instante
o  sopro vital
segue o som  errante.

Difusa   luz  de vitral.
Quieto, sólido e opaco
O corpo no  banco
Aguarda  sereno.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Na esquina do dia




Na esquina do dia
(emprestada do Sabino, que talvez tenha emprestado também)



Pois na primeira esquina do dia

Há um boteco com cafezinho de coador para os inocentes,

Sol quase lambendo o balcão

E cachacinha para quem não é feito de ferro... 

Um quarteirão de dia, depois,

Na segunda esquina, 

Há um bar com guaraná,

Pedaço de pizza de mussarela e  petisco 

Cerveja gelada e caipirinha para os viventes de barro...

Na última esquina, logo ali depois, 

Já dobrando no quarteirão da noite 

Conversa de calçada e esquecimento de luar.

Esquecimento de luar sempre tem boa memória.
 
É até capaz de assobiar a Valsa número Dois do Mignone.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

A vida de meu corpo

                                                               Ser imortal é insignificante; com exceção do homem,  todas
                                                               as criaturas o são,  pois ignoram a morte.
                                                              (Jorge Luis Borges, O imortal in O Aleph, Ed Globo/Mec, 1972)


Não há quem mais gulosa seja
Na fome de  si mesma
Senão essa coisa sem nome que é a vida
Como uma vez bem nomeou, sem nomear,
Clarice.


Da célula,  invisível ao nosso olhar,
uma única ou milhões,
Liquens, cogumelos,
gigantesco jatobá, aves, peixes, borboletas, 
ao nosso mediano corpo,
tudo que tem vida
se move mais ou menos
mas  tem fome sempre,
neste contínuo, imenso elo 
de partos de sementes, fragmentação
óvulos fecundados
mitogênese,
em que a vida alimenta a vida.

Ela deixará um dia
Aquele que eu,  hoje,  digo ser,
Pois a cada um deixa
e jamais a todos.

E me espalhará faminta
no imperceptível do seu mundo
onde nada se perde
a não ser
a singela,
a pura
a simples
a desimportante
unidade orgânica.


É  insondável
Se sobrará alguma coisa mais
deste  que conhece a morte.
Mas não será com certeza deste corpo
de matéria feito,
inteiro retornado ao todo.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Fantasia marítima

Pedro
no porto
aponta
a  proa
para  o pôr do sol.

Soerguida
ao  vento
a  ló  malogra o intento
da  partida.

Invento só
de  quem jamais deixou a terra.

Nem para o ar
Nem para o mar
são os pés  plantados
no chão duro, 
empedrado
De Pedro.

Ainda assim
num desplante
de  andarilha
a  alma  solitária segue
a trilha da última luz do dia.

Reinventou-se Pedro.